O que é violência política de gênero?
Em 25 de novembro de 1960, na República Dominicana, as irmãs Mirabal – Patria Mercedes, Minerva Argentina e Antonia María Teresa – foram assassinadas por se oporem à ditadura Trujillista. Em 2002, a colombiana Ingrid Betancourt foi sequestrada pelo grupo guerrilheiro FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), enquanto fazia campanha para as eleições presidenciais. Ela foi mantida em cativeiro até 2008. Em 2013, no México, Elisa Zepeda Lagunas, foi arrastada pela praça da cidade e cortada quase até a morte, teve sua casa incendiada e seu irmão morto em represália ao seu ativismo pelo direito das mulheres indígenas. Em 2018, na cidade do Rio de Janeiro, a quinta vereadora mais votada no município, militante pelos Direitos Humanos, Marielle Franco, foi assassinada a tiros. Em 2020, em São Paulo, a deputada estadual Isa Pena, foi apalpada por um colega no plenário da Casa.O que essas histórias possuem em comum? Materializam a violência política de gênero.
Quando falamos em violência de gênero e/ou contra à mulher a sua face mais conhecida é aquela que acontece no espaço privado, longe dos olhos da sociedade e que é cometida em grande parte por companheiros e/ou ex-companheiros. No entanto, existe um outro desdobramento da dominação masculina que se materializa na cena pública, violando os direitos políticos das mulheres e impedindo e/ou criando obstáculos para que elas possam defender seus interesses e suas pautas políticas.
Esse tipo de violência é denominada de violência política de gênero, onde as práticas violentas têm como foco as mulheres que estão na disputa do poder político, seja em partidos ou movimentos sociais. Durante a campanha eleitoral ou durante o exercício do mandato e mesmo após seu fim. Da mesma forma que a violência doméstica, a violência de gênero na política pode incluir violência física, psicológica, sexual, moral, patrimonial e o feminicídio. O principal objetivo é diminuir ou anular os direitos político-eleitorais das mulheres.
A violência política com base no gênero baseia-se no assédio que é naturalizado na cultura política, isso explica os ataques verbais que exploram a sexualidade das mulheres, as suas características físicas e que tem por objetivo desqualificá-las, tornando-as uma chacota. Além disso, não são raras as denúncias de ameaça de morte e agressões física e sexual.
Esse é um tipo de violência ainda invisível e que não possui a atenção devida do Estado, o que impacta na produção sistemática de dados. No entanto, universidades e organizações sociais buscam realizar pesquisas sobre a temática a fim de jogar luz nessa problemática. Na Colômbia, o Instituto Holandês para a Democracia Multipartidária (NIMD), realizou a “Pesquisa de Percepção de Mulheres Eleitas 2012-2015” em 2016 com 166 candidatas e realizou 35 entrevistas com mulheres eleitas, concluindo que 6 de cada 10 mulheres afirmaram ter sofrido violência política. No México, um monitoramento realizado entre maio e julho de 2018 pelo coletivo feminista Luchadoras, apontou que 62 candidatas sofreram agressões e ameaças por meio do uso de tecnologias e redes sociais. No Brasil, o Instituto Alziras realizou uma pesquisa com 45% das 649 prefeitas eleitas em 2016 e mostrou que 53% já sofreu assédio ou violência política pelo simples fato de ser mulher e 30% já sofreu assédio e violências simbólicas no espaço político.[1] Em 2020 o Instituto Marielle Franco realizou pesquisa com 142 mulheres negras candidatas em 2020, revelando que 98,5% delas sofreram mais de um tipo de violência política.[2]
Na América Latina, a violência e o assédio político baseado no gênero são um desafio comum às mulheres que ingressam na vida política. Uma vez eleita, ou ocupando o lugar de liderança de movimentos sociais, a mulher enfrentará uma rotina exaustiva de discriminação, ameaças e violências, em diferentes âmbitos. Assim como na violência doméstica a consequência mais grave é o feminicídio.
O aumento da participação das mulheres nos espaços de debate e de poder político tem sido acompanhado pelo aumento sistemático de violência contra elas. O caminho para a superação desse cenário parece começar com a compreensão de que esse tipo de violência é uma tentativa de impedir que mulheres assumam espaço na política. As leis que prevêem a participação das mulheres no cenário político não são suficientes para corrigir essa distorção democrática.
Sendo assim, é preciso reconhecer a violência política de gênero como um evento real e grave que gera consequência para a participação das mulheres e desse modo, para a própria democracia.
[1] Dados disponíveis em: www.https://eva.igarape.org.br/
[2] Disponível em: www.violenciapolitica.org
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