Como nasce uma empregada?
No último dia 01/02/2022 jornais on-line e blogs noticiaram que, após denúncia anônima, uma mulher que atuava como empregada doméstica em Mossoró, no Rio Grande do Norte, foi resgatada de uma condição análoga à escravidão.
De acordo com o depoimento da vítima, ela atuava como empregada doméstica há mais de 30 anos para a mesma família em troca de teto e comida. Não recebia salário, não tinha direito a férias e não saía da casa dos patrões. Infelizmente situações como essas não são tão incomuns. A servidão é um traço que atravessa o trabalho doméstico no Brasil, historicamente.
Como estudiosa da temática, observo em minhas pesquisas que para muitas mulheres e meninas, o trabalho doméstico se apresenta como a realidade possível. Desde muito pequenas, por volta dos 5 anos de idade, meninas pobres são incentivadas a se dedicar ao serviço doméstico dentro de suas casas. Lavar louça, algumas peças de roupas, cuidar dos pequenos, limpar o quarto, dentre outras tarefas que são realizadas por elas.
Existe ainda a prática, culturalmente aceita de “dar” as filhas para que outras famílias, geralmente com melhores condições de vida, possam criá-las. Essa realidade, ainda muito comum nas cidades do interior do Brasil, transforma meninas em empregadas, em criadas. Em troca de teto e comida e em alguns casos da promessa dos estudos, essas garotinhas iniciam uma vida repleta de compromissos com os cuidados do lar. São as empregadinhas, as ajudantes, as babás. Não raro, em muitos casos, essas meninas permanecem por um longo tempo no trabalho doméstico.
Vidas marcadas pelo distanciamento da família, pelo convívio com pessoas (que em muitos casos) as submetem e exploram, pelo trabalho repetitivo e exaustivo e pela discriminação e desvalorização que essa tarefa possui na sociedade.
Essas são as bases que forjam o trabalho doméstico, marcadamente racializado, e que impossibilitam a valorização, o reconhecimento e o respeito por essas trabalhadoras. Ainda hoje, esse é o nicho de trabalho com menor índice de regulamentação no Brasil. Segundo dados do IBGE, menos de 40% do total de trabalhadores domésticos no país possuem carteira de trabalho assinada.
Sob o véu da proximidade e embalado pelo discurso “como se fosse da família” muitas trabalhadoras domésticas veem seus direitos sendo vilipendiados enquanto continuam servindo às famílias de classe média e média alta do Brasil.
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