O horror ao feminino no Brasil – parte 2
Há pouco mais de dois meses eu escrevia aqui no blog sobre o horror ao feminino no Brasil. O texto tratava dos recentes casos, há época, de agressão e violência sofridos por mulheres cis e trans e como esse histórico se relaciona com o horror ao feminino, visto como menor, utilizável, questionável e consumível.
Mais uma vez, a realidade nos dá mostras de como esse ódio às mulheres e a tudo que a elas se relaciona está vivo, vivíssimo entre nós. O exemplo absurdo da vez foi a visita do economista Marco Heredia Viveros ao gabinete do deputado estadual Jessé Lopes (PSL-SC). Para quem não está “ligando o nome a pessoa”, Marco Viveros é o agressor de Maria da Penha, que tentou assassiná-la por duas vezes em 1983.
A visita, com direito a foto e post nas redes sociais do deputado, teve como objetivo, segundo o próprio político, ouvir a versão do agressor, que foi classificada como, no mínimo, intrigante. Bom, o que parece no mínimo intrigante é um parlamentar, no uso de suas atribuições, dedicar seu tempo em ouvir uma história que já teve sua versão verdadeira comprovada. Afinal, o caso que ganhou repercussão mundial deixou a vítima paraplégica depois de ser alvejada por um tiro nas costas e de quase ser eletrocutada enquanto tomava banho.
A atitude do deputado revela a misoginia enraizada na sociedade brasileira. Ao classificar de intrigante a versão do agressor busca-se desqualificar a vítima e desacreditá-la, ações comumente enfrentadas por mulheres vítimas de violência. Sob o discurso de defesa da família, que é um dos lemas do parlamentar, se relativiza a barbárie e denota um flagrante retrocesso à garantia de uma sociedade livre da violência contra a mulher. Isso é inadmissível, sobretudo em um país que só em 2020 teve, aproximadamente, 17 milhões de mulheres vítimas de violência.
Que não se enganem aqueles que imaginam que o ódio às mulheres perpetrado por uma parcela significativa da sociedade é destinado, exclusivamente, às mulheres feministas. Nessa lógica doentia e preconceituosa, você pode ser a encarnação do modelo “ideal” de mulher definido por eles, mas se em algum momento se não atuar dentro da cartilha do patriarcalismo, sentirá também o julgamento, a humilhação e outros tantos tipos de violência.
Classificar como intrigante a versão do acusado e condenado de tentar, por duas vezes, assassinar a ex-mulher é um absurdo sem tamanho. Buscar argumentos para defender a atitude do parlamentar é ser desonesto com toda a trajetória de luta da vítima, que buscou justiça por 19 anos e 6 meses e se tornou um símbolo do combate à violência contra a mulher. Inclusive, dando nome à Lei n. 11. 340 sancionada em 07 de agosto de 2006, que segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), é uma das mais eficientes do mundo.
Em um país onde se mata mulheres como se mata baratas, a atitude do deputado em nada contribui para a diminuição dessa violência. Pelo contrário, vulgariza as mortes e as agressões e ofende os familiares que perderam suas mães, irmãs e filhas para o machismo nosso de todo o dia. Não devemos, de jeito nenhum, minimizar a gravidade dessas atitudes e muito menos, naturalizá-las.
Angélica Lira
Publicado em 12:25h, 02 setembroMais um texto excelente, Marusa. Esse tipo de atitude de um parlamentar realmente não deve ser ignorada.
Marusa Silva
Publicado em 17:07h, 16 setembroAngélica, não podemos nos calar.
Graciete
Publicado em 12:27h, 02 setembroÉ uma pena vermos um retrocesso como esse. Ainda temos um longo caminho de conscientização e desconstrução da violência contra a mulher!
Marusa Silva
Publicado em 17:06h, 16 setembroÉ verdade, Graciete. O caminho é longo…
Larissa
Publicado em 16:57h, 16 setembroRevoltante. É um descaso, é querer minimizar, desacreditar mulheres vítimas de violência. Estamos sempre tão expostas perante essa sociedade misógina… É um medo constante.
Marusa Silva
Publicado em 17:05h, 16 setembroLarissa, você expressou muito bem o sentimento, é um medo constante.