Uma explosão antifeminista?
Há algum tempo venho me deparando com inúmeros perfis nas redes sociais que “pregam” uma espécie de antifeminismo, tratando o movimento como desnecessário, equivocado e quase diabólico. Recebo, diariamente, de amigas próximas, posts que recebem milhares de curtidas (o que em tempos de rede social se traduz em legitimidade), sobre os malefícios do feminismo para vida das mulheres. Tem de tudo e para todos os gostos. Alguns fundamentam suas críticas a partir das escrituras sagradas, outros argumentam para o “perigo” das filosofias vãs escravizarem as mentes impedindo as pessoas, sobretudo as mulheres, de exercerem autonomia.
De fato, não é de hoje que nos deparamos com uma espécie de rejeição ao termo feminismo e, boa parte disso, deve-se aos estereótipos que foram sendo construídos a respeito do movimento e das próprias feministas. Muitas mulheres, com quem converso, acreditam que devemos lutar por igualdade entre homens e mulheres, mas não se identificam como feministas. Isso porque acreditam que ser feminista é, dentre outras coisas, ser contra os homens, a maternidade, não se depilar e por aí vai.
Segundo a cientista política Ronee Schreiber, o antifemisnimo nos Estados Unidos começou a tomar forma como uma reação contrária ao movimento sufragista. Veja só! Em 1868, foi registrado o primeiro movimento antissufragista em Massachusstes. Fatos com esse demonstram que esse tipo de reação vem de longa data e está pulverizada em todos os cantos.
Em 2018, uma pesquisa do instituto YouGov no Reino Unido, revelou que apenas 34% das mulheres inglesas responderam sim a pergunta: você é feminista? Apesar de todas defenderem a igualdade entre homens e mulheres.
O movimento feminista, em suas variadas vertentes, busca a igualdade. As mulheres não estão e nunca estiveram em condições iguais em relação aos homens, isso é fato. Existem estudos sérios, pesquisas e estatísticas que revelam como é profunda a desigualdade de acesso a direitos, salários, empregos entre os gêneros, o que ao me ver, só reforça a necessidade do movimento.
A escritora e feminista nigeriana, Chimamanda Adichie, em uma palestra proferida em 2012 fez um importante chamamento “Sejamos Todos Feministas”, para que a agenda da igualdade e da justiça social seja reivindicada e concretizada. Alguns podem dizer: por que usar a palavra feminista? Por que não dizer que acredita nos direitos humanos, ou algo do tipo? Porque isso seria desonesto! Claro que o feminismo e suas pautas fazem parte dos direitos humanos. No entanto, usar um termo amplo como esse é negar o que o feminismo sublinha, que é a particularidade do problema de gênero.
Como já mencionado anteriormente, o termo feminista, assim como o movimento, historicamente enfrentou resistência. Qual seria a novidade então? Alguns pontos necessitam ser observados com mais cuidado. Primeiro, deve-se considerar o alcance dos discursos potencializados pela internet. Com argumentações simples recheadas de apelo moral e religioso, esses discursos apresentam vários equívocos sobre o sentido do feminismo, utilizando como estratégia o ataque a todos, todas e todes que estão comprometidos com a agenda da igualdade de gênero.
Utilizar argumentos como: não sou feminista porque nunca foi por direitos iguais ou porque sou a favor da família, parece uma grande confusão, um grande equívoco quando não um descompromisso com a história do movimento. O feminismo não milita contra a família, como os arautos da moralidade gostam de afirmar, pelo contrário, ele permite que você, só você decida, se quer ou não ou quando quer formar uma família. Não é sobre o que uma mulher deve fazer e sim sobre o que ela pode fazer, a partir da sua escolha. Não é sobre a mulher dominar o homem ou propagar o machismo reverso. É sobre igualdade de oportunidade em todas as esferas da vida social. Quem diz o contrário, não entendeu nada.
O que presenciamos é uma interpretação da pauta feminista feita sem cuidado ou conhecimento sobre o debate. Utiliza-se de análises superficiais, mas que reverberam em parte significativa da sociedade. Com isso geram antipatia ao movimento e a quem faz parte dele, desmobilizando a adesão de muitas mulheres ao feminismo.
Invalidar o movimento é invalidar suas conquistas. É ser desonesto com aquelas que foram pioneiras, que abriram os caminhos para que hoje pudéssemos estudar, trabalhar, escrever, publicar e escolher. Ainda precisaremos de tempo para analisar e avaliar o alcance e os impactos dos discursos antifemistas nas redes sociais, mas devemos observar criticamente qual é o discurso que resguarda e o que impede a nossa liberdade.
Leandro Anido
Publicado em 16:50h, 26 agostoExcelente. Muito esclarecedor. Realmente as pessoas confundem o termo feminismo, e daí criam preconceitos. Educação é tudo