Por que pílula anticoncepcional apenas para mulheres? - Generalizando
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Por que pílula anticoncepcional apenas para mulheres?

Por que pílula anticoncepcional apenas para mulheres?

A pílula anticoncepcional causou uma revolução quando foi apresentada à sociedade na década de 1960. A ideia de dar à mulher maior controle sobre a sua sexualidade foi recebida com entusiasmo. A partir de então elas poderiam decidir quando engravidar, por exemplo.

Depois de mais de seis décadas da apresentação da pílula anticoncepcional, a lista oficial de métodos contraceptivos da Organização Mundial da Saúde (OMS), conta com 20 métodos, desses apenas 2 são para os homens. Para além de alguns desafios no desenvolvimento de uma pílula anticoncepcional para homens, como apontam alguns especialistas, o fato é que já naturalizamos a ideia da responsabilidade feminina pela contracepção.

Em entrevista à BBC News Mundo, Adam Watkins, professor de Biologia Reprodutiva da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, disse que há muito tempo se discute sobre a criação de anticoncepcional masculino. Entretanto, aponta o professor, a razão central pela qual ele ainda não foi desenvolvido se dá pelo fato do anticoncepcional feminino ser muito eficiente. Do ponto de vista econômico, muitas empresas farmacêuticas não veem a necessidade de investir em outro tipo.[1]

As pesquisas sobre a contracepção masculina enfrentam alguns desafios. O professor Watkins aponta que a biologia da reprodução de espermatozoides é bem compreendida e que os maiores obstáculos estão nos efeitos colaterais causados por alguns componentes.

Em 2016 um estudo precisou ser interrompido porque os homens que participaram relataram efeitos insuportáveis. Foi injetado, no organismo dos participantes, testosterona e progestógenos similares aos hormônios da pílula feminina, que causaram espinhas no rosto e mudanças no humor. Mulheres que fazem uso de pílulas anticoncepcionais relatam dores de cabeça, ansiedade, aumento de peso, baixa libido e coágulos sanguíneos.

A pílula masculina não existe apenas pela falta de interesse das empresas farmacêuticas, mas também por questões de gênero. Lisa Campo-Engelstein, médica e diretora do Instituto de Bioética e Humanidades da Saúde da Universidade do Texas (EUA) e pesquisadora do futuro da saúde reprodutiva, aponta para o fato dessa responsabilidade ter sido deixada exclusivamente para as mulheres. São as mulheres que suportam as cargas financeira e de saúde relacionadas à contracepção. Esses métodos são, geralmente, mais caros, porque exigem acompanhamento periódico. A médica é uma defensora da produção da pílula masculina e lembra que, nos Estados Unidos da América, muitos planos de saúde não cobrem a contracepção.

Enquanto esses debates acontecem, são as mulheres que ficam com o ônus da contracepção. Para que haja transformação desse cenário é necessária uma profunda mudança nas normas de gênero dominantes quanto à saúde reprodutiva. Só assim poderemos vislumbrar um futuro diferente.

Mesmo que a ciência avance nesse sentido e que alguns homens estejam dispostos a assumir a responsabilidade no cuidado com a contracepção, como vem sendo apontado em alguns estudos, é pouco provável que haja adesão ampla dos homens a esses métodos se não houver também uma mudança nos padrões culturais.

[1] Entrevista concedida em março de 2021. Disponível em: https://www.bbc.com.

Marusa Silva

Marusa Silva

Doutora em Sociologia Política, pesquisadora e autora de livros e artigos sobre desigualdade de gênero e integrante do Atelier de estudos de gênero da Universidade Estadual do Norte Fluminense – RJ

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