Avanço legislativo contra a cultura do estupro
O presidente Jair Bolsonaro sancionou no dia 22/11/2021 a lei n. 14.245/21, que recebeu o nome de Lei Mariana Ferrer em homenagem à influencer que denunciou um estupro em dezembro de 2018.
A lei, de autoria da deputada Lídice da Mata (PSB-BA), protege as vítimas de crimes sexuais de atos contra sua integridade moral e psicológica durante o processo judicial. Obrigando juízes a zelar pela integridade da vítima em audiências de instrução e julgamentos.
O caso da influencer Mariana Ferrer, que serviu de estopim para a elaboração do PL 5.096/20, chamou a atenção pelas cenas de horror e violência que viralizaram nas redes sociais. Durante a audiência, o advogado que defendia o empresário do ramo de futebol André de Camargo Aranha ( acusado de ter dopado e estuprado Mariana), fez menções à vida pessoal da vítima, valendo-se de fotografias íntimas com o intuito de descredibilizar Mariana.
Práticas como as assistidas durante a audiência da influencer são, infelizmente, comuns às mulheres que denunciam crimes sexuais. Nesses casos, lança-se mão de elementos da esfera íntima e privada de quem faz a denúncia para criar suspeitas sobre sua conduta moral e sexual. Esses tipos de práticas funcionam como instrumentos da cultura do estupro.
O termo “cultura do estupro” vem sendo utilizado desde a década de 1970, pela chamada segunda onda do feminismo. O seu sentido é apontar para comportamentos tanto sutis como explícitos que silenciam ou relativizam a violência sexual cometida contra as mulheres. Desse modo, a palavra cultura no termo cultura do estupro, reforça que esses comportamentos não devem ser naturalizados, pois se é cultural nós criamos e se criamos podemos modificá-los.
A fatídica audiência de Mariana Ferrer ocorreu de forma virtual e veio à tona pelas mãos da jornalista Schirlei Alves, que trabalhava para um jornal em Santa Catarina e logo depois foi demitida. No vídeo, o advogado do acusado diz, entre outras coisas, “graças a Deus não tenho uma filha do teu nível, graças a Deus, e também peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher como você”. Esse tipo de depoimento sugere que a vítima é culpada por ter sofrido a violência ou que está mentindo, ou seja, o clichê de uma sociedade machista.
Aqueles que acreditam que não existe estupro e que toda a denúncia feita por mulheres são falsas, porque elas são fingidas e manipuladoras (argumentos, em muitos casos, justificados com fatos da vida íntima e sexual das vítimas), tenderão achar que a lei é um exagero. Onde já se viu, não poderemos desmascarar uma mentirosa que acusa um pobre homem de violência sexual? No entanto, pessoas que têm um mínimo de sensatez entendem que a maioria das vítimas não mentem sobre um estupro e não merecem ser tratadas como criminosas.
A lei Mariana Ferrer é um avanço legislativo. É uma conquista para as mulheres. É uma conquista para a influencer que dá nome a lei e que assistiu, por duas vezes, o acusado de seu estupro ser absolvido. Por sua vez, Mariana continua lutando para anular o processo e levá-lo ao STF.
Importante salientar que, independente do resultado do julgamento do processo, nenhuma mulher merece ser humilhada em sua condição de denunciante e vítima. Comportamentos como o que a lei objetiva combater são práticas violentas que encorajam abusadores ao mesmo tempo que desencorajam as denúncias de milhares de vítimas. Que a lei seja um importante passo para uma mudança profunda na nossa cultura.
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