Feminismo e cristianismo: uma relação possível? - Generalizando
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Feminismo e cristianismo: uma relação possível?

Feminismo e cristianismo: uma relação possível?

O cristianismo pousou em terras brasileiras com a chegada dos colonizadores. Primeiro vieram os sacerdotes católicos, em seguida, em período pós Reforma Protestante na Europa, chegaram os protestantes reformados de orientação calvinista, ainda no século XVI, com a invasão francesa. Mais tarde, os jesuítas orientados pela perspectiva contrarreformada se estabeleceram aqui para representar a Igreja Católica que detinha controle político nos países europeus não reformados como Portugal e Espanha.

Outros grupos, como os protestantes de missão aportaram por aqui no século XIX e no século XX, observamos o estabelecimento das igrejas evangélicas norte-americanas caracterizadas pelo avivamento carismático. Lá pelas décadas de 1970 e 1980 o movimento neopentecostal começou a ganhar espaço.

Este mosaico de vertentes do cristianismo permite-nos mapear alguns pontos: não há movimentos feministas em igrejas pentecostais e neopentecostais; as primeiras feministas vieram de igrejas protestantes históricas (luterana e anglicana) que inspiraram, por exemplo, mulheres metodistas.

Observamos com isso que a práxis feminista entre as chamadas protestantes de misssão é resultado da entrada das mulheres em posição de sacerdócio. Algo impensável até a primeira metade do século XX para o protestantismo e  ainda hoje  para o catolicismo.

À medida que as igrejas foram cedendo espaço para as mulheres, os ideais feministas foram sendo, lentamente, processados pelas comunidades de fé. Uma subversão de base, um trabalho sutil que promoveu e promove importantes avanços na defesa de pautas que são necessárias às mulheres.

O feminismo protestante latinoamericano se constitui em perspectiva interseccional, num cenário de golpes e ditaduras que solaparam a região. Um feminismo que teve um caráter político de confronto em tempos de ditadura.

Apesar da sua autenticidade, algumas pautas caras ao feminismo são delicadas para o movimento subversivo nas comunidades de fé, mas mesmo assim não deixam de ser enfrentadas. O aborto, por exemplo, é veementemente condenado no catolicismo, no entanto o movimento feminista Católicas pelo Direito de Decidir (CDD), luta pela defesa dos direitos sexuais e reprodutivos. O argumento norteador dessa luta é considerar que a criminalização do aborto e das mulheres que o praticam sem criminalizar os homens que as engravidam  e as abandonam é uma parcialidade desumana.

Pautas como a inclusão da comunidade LGBTQIA+ no segmento religioso cristão protestante também está presente na luta destas mulheres. Apesar dos avanços, a caminhada de feministas cristãs nem sempre é perceptível para movimentos de mulheres que estão fora do círculo eclesiástico, até porque o próprio ambiente religioso é opressor. O que nos parece um grande equívoco, uma vez que o cristianismo é orientado pelos ensinamentos de Cristo.

Jesus não era machista! Pelo contrário! Os registros nos mostram que seu tratamento em relação às mulheres se distancia muito daquele que foi institucionalizado pela Igreja Católica e mais tarde copiado pelo protestantismo. Jesus Cristo andava na companhia de mulheres, se deixava ser visto em público com elas, as tratava com respeito em quaisquer circunstâncias e foram as mulheres, as primeiras a receber a missão após sua morte. É preciso resgatar a centralidade das mulheres.

O que parece ser possível vislumbrar em um horizonte próximo é um protagonismo cada vez maior e significativo das mulheres nos espaços religiosos, trazendo à tona questões caras a todas. Essa luta é árdua, porque será preciso desconstruir um modelo de patriarcado legitimado religiosamente. Esperamos das novas gerações de mulheres cristãs feministas avanços maiores e conquistas significativas. Tenhamos fé!

Marusa Silva

Marusa Silva

Doutora em Sociologia Política, pesquisadora e autora de livros e artigos sobre desigualdade de gênero e integrante do Atelier de estudos de gênero da Universidade Estadual do Norte Fluminense – RJ

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